A “Maioridade” Penal no Brasil: 16 ou 18?

O Congresso Nacional debateu sobre a possibilidade de redução da idade penal no Brasil. Inevitavelmente, fui estudar e aprendi o que compartilharei com vocês agora. A Constituição Federal, em seu art. 228 estabelece que: "São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitando-se às normas da legislação especial." Essa norma constitucional estabelece que as pessoas menores de 18 anos não serão responsabilizadas penalmente por seus atos como os adultos.  Por outro lado assegura ao adolescente a responsabilização por seus atos infracionais, na forma da legislação especial, que, em decorrência da primeira, não poderá conter princípios de direito penal, sendo vedado o direito penal juvenil, ou seja, na forma do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).Como regra, os juristas entendem que a norma do art. 228 da Constituição Federal foi estabelecida na nossa Constituição como cláusula pétrea.

Cláusulas pétreas são limitações formais ao processo de modificação da Constituição.  Alguns assuntos foram considerados tão importantes que foram engessados pelos constituintes que elaboraram a Constituição, de maneira que parlamentares seguintes não poderiam sequer deliberar emenda que visassem qualquer modificação nesses tópicos.  A Constituição, assim, autoriza mudanças em seu conteúdo desde que sejam preservados seus conteúdos essenciais.

As cláusulas pétreas podem ser encontradas no artigo 60§ 4º, que possui o seguinte teor:

§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

 

A norma do art. 228 é considerada cláusula pétrea porque, apesar de encontrar-se no Capítulo VII (Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso), do Título VIII (Da Ordem Social), não há como negar-lhe, em contraposição às de seu art. 5° (Capítulo I, Dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, do Título II, dos Direitos e Garantias Fundamentais), a natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias. Dessa forma, na regra da maioridade penal está imbutida uma garantia pessoal, fazendo, portanto, parte do núcleo imutável da Constituição.

Esse foi o entendimento que prevaleceu, até então, na doutrina e na jurisprudência brasileira.  Durante muito tempo entendeu-se, majoritariamente, que a maioridade seria imutável dentro da ordem constitucional vigente.  Recentemente, uma onda de relativização tomou conta de boa parte da comunidade jurídica e passou-se a considerar seriamente essa possibilidade. Passou-se a valorizar uma interpretação restritiva das cláusulas pétreas para excluir aquelas normas que não são citadas explicitamente pelo art. 60,§4°. Foi esse movimento que possibilitou a votação e aprovação, em primeiro turno, da PEC 171 na Câmara dos Deputados que tem como objetivo reduzir a idade penal para 16 anos.

O Direito reclama para si uma coleção de normas, princípios e dogmas que reclamam universalidade e atemporalidade.  Assim, os estudantes de Direito aprendem que a regra da maioridade penal, tal como posta na nossa Constituição Federal é uma cláusula pétrea.  Pronto!  Não pode ser modificada pelo Poder Legislativo que contém em si apenas poderes constituídos que devem respeitar o núcleo essencial da Constituição.  Núcleo esse eleito pelo poder constituinte originário.

O que mudou no Direito para que chegássemos até a discussão atual acerca da PEC 171/1993?  Por que agora discutimos a modificação de uma norma constitucional que sempre foi tratada como cláusula pétrea?  Mudou o Direito?  Ou mudou o conceito de cláusula pétrea? Não houve mudança alguma na dinâmica mutável do Direito.  Ele sempre mudou.  Assim se mantém estável.  As controvérsias que existem na doutrina e jurisprudência oscilam de acordo com a reconfiguração da rede que movimenta o direito.  Assim, se antes a maioridade era considerada cláusula pétrea pela maioria da comunidade jurídica, uma “onda de violência”, ou a “propagação do sentimento de insegurança” ou qualquer outro fator que não envolva, especificamente, o campo do direito pode provocar uma mudança nesse campo para que ele permaneça estável.  Se o direito mantém a posição e não muda seu entendimento, perde aliados e se enfraquece.  Essa PEC é um exemplo material do caráter mutável do direito.

Em 1988, prevaleceu o princípio de proteção integral da criança e do adolescente.  Em 2015, com o crescimento de movimentos ultraconservadores há um movimento forte que quer fazer prevalecer o aparato de segurança pública.  A mídia oficial assume o lado desse último movimento, como poderoso aliado.  Para o direito resta, em movimento majoritário, se rearticular para acompanhar essa mudança.  Mudar para continuar o mesmo.  O exemplo aqui escolhido, em nossa opinião, retrata que nem toda mudança de entendimento do direito configura uma evolução, ou uma melhoria.  Mas pode ser considerado um deslocamento necessário para manutenção da ordem jurídica posta. Fiquem ligados!!!! Bjokas!

 

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Adriana “Drica” Destra

Minha história diz muito sobre minha personalidade. Fui adotada por uma família muito rica quando tinha dois anos. Só fiquei sabendo disso aos 10 e desde então alimentei questionamentos a respeito dos deveres e direitos das pessoas. Aos 12, eu já conhecia o ECA inteiro. Aos 15, já tinha feito um curso on-line de Introdução ao Direito. Aos 17, presenciei um mau uso do Direito por parte de um advogado que manipulou a lei em benefício próprio. Fiquei com raiva, mas não desisti. Hoje, faço Direito na melhor Universidade do país e sonho em pulverizar o conhecimento jurídico a fim de melhorar a educação no país e o relacionamento entre as pessoas. Como acredito na Educação e que, se quisermos fazer um bom trabalho devemos começar desde cedo, vou construir um trabalho aqui no Galera Cult sobre Noções de Direito. Espero que ajude a todos nós a formar uma sociedade mais fraterna e justa.